segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Ensaio disfarçado de Retrospectiva (Nota mental: arranjar um título melhor)

E cá estou eu em um quarto de casa de praia, I mean – você sabe bem o que é uma casa de praia, certo? Ao menos deveria saber, ou eu suponho que poderia ter o prazer de saber do que se trata. Casas de praia, essas que nos pertencem, são como as nossas casas da cidade. Você tem quase tudo o que se encontra em uma casa normal – menos o que necessita. Digo, sempre o que você mais precisa está em falta e, nesses casos, os habitantes – temporários - da casa costumam lamentar de forma divertida e dizer que, afinal, trata-se de uma casa de praia.

Pois bem, onde mesmo estou tentando chegar com isso? Ah, sim. Lamentavelmente esqueci de situá-los. É dia 25 de dezembro de 2010. Exactly, Natal. Eu prefiro nem comentar muito sobre a simbologia da data primeiro porque sinto que não tenho conhecimento sobre todos os tipos de comemoração que estão ocorrendo no mundo, e por isso não acho justo considerar apenas o meu caso isolado. Segundo porque eu sinceramente me sinto, diante de todas essas diferenciações, um tanto quanto confusa. Pois é. As pessoas mudam muito nessa data. Particularmente, desde criança eu supunha que todos os dias deveriam ser Natal – não porque eu ganhava presentes, porque de fato ganhava pouca coisa; mas porque as pessoas soavam insensatamente bondosas nesta data. Eu achava aquilo estranho, mas acabava que me divertia. Quer dizer, eu poderia aprontar as minhas traquinagens sem me preocupar muito, já que a bronca provavelmente seria mediana em comparação com a do restante dos dias do ano. O problema era quando tiranamente se aproveitavam do meu próprio argumento: “comporte-se, é Natal”. Ah, aí era batata. Bom, já situados, devemos prosseguir.

Eu estou na minha casa de praia – na dos meus pais, claro – e é Natal. Depois de um ano particularmente cansativo pra mim, cheio de descobertas, receio dizer que estou viva. É, receio. Eu me matriculei numa universidade, consegui concluir com algum sucesso dois semestres do meu curso, que é algo que eu diria inclusive amaldiçoado (porque eu gosto demais daquela jossa. Não é possível que se goste tanto de uma mesma coisa daquelas). Dentro desses dois semestres ouso dizer que me diverti simplesmente horrores. Aprendi a colocar pessoas burras e mal-educadas no seu lugar, tanto garotas interesseiras quanto garotos não tão bem intencionados pra correr. Participei de dois projetos extencionistas, esbocei algumas amizades – e sinceramente confesso que não era a principal idéia, já que eu supunha ficar sozinha o resto da faculdade. Mas não. Não em quantidade desejada, embora algumas oportunidades de boas conversas surgiram e eu aproveitei com unhas e dentes. Professores, estes pessoas fantásticas, inteligentes, dedicados, audaciosos, intempestivos, provocantes; ao menos pra mim, que sempre busquei o que há de mais simples e claro quanto o mais complicado e obscuro, quando o assunto é conhecimento.

Arranjei um emprego – o que me fez e ainda está fazendo crescer emocional e profissionalmente, coisa que muitos ficariam escandalizados se eu dissesse, mas eu decididamente preciso crescer nesses aspectos. E, oh deus, em tantos outros aspectos. Mas às vezes é difícil para as pessoas acreditarem que esse suposto “brilhantismo” meu é algo adquirido. Sincero, eu não acho que baste “nascer para brilhar”, você precisa buscar esse brilho, essa genialidade, se não vai ser exatamente a mesma porcaria que qualquer um que você encontre por aí perdido.

A questão é que esse texto bem provavelmente está tomando o corpo de uma retrospectiva de final de ano, uma vez que estou trancada dentro de um quarto de casa de praia, em quase total escuridão, não fosse a tela do notebook e a luz do meu celular, que vez ou outra eu fuço pra trocar de música. Aliás, se me permitem, gostaria de dar um “alô” pra música. É, a música, esse negócio que eu suponho que uma certa pessoa poderia bem explicar muito melhor do que eu, mas que eu humildemente classifico como uma das coisas mais fantásticas “inventadas” na face da Terra e que tanto me ajuda a lidar com meus problemas e emoções mais insanas. Alô, música, foi bom conviver com você durante esse ano... Bem como por toda a minha vida até aqui.

Falando em alguém que poderia bem melhor do que eu explicar o que diabos é “música”, existem pessoas que você precisa parar tudo o que está fazendo pra poder reconhecê-la. Ela está ali, na sua frente, com todos os problemas inerentes à condição humana e você por um instante quase entra em desespero pelos problemas dela. Dela. Esquece os seus. Os seus são bobagem. Você quer é ajudar aquela pessoa. Fazê-la sorrir. Fazê-la sentir que o sol faz algum sentido, que o ar que respiramos é simplesmente o melhor que poderíamos ter e que antes de sermos o que gloriosamente somos, éramos nada e que “o aqui e o agora” são um pequeno e curto espaço de tempo até que chegue a sentença definitiva, mais conhecida pelo termo morte. Você quer segurar essa pessoa nos braços. Não com a intenção de tomar pra si as dores dela, mas pra fazer com que ela se sinta amada e querida, que se sinta como você mesmo quer se sentir, mas que supõe não haver ninguém pra fazer o mesmo por você. Despido de orgulho e egoísmo você entrega seu coração, não antes sem questionar o porquê de o mundo ser como ele é e as pessoas serem como são, ou como deixam de ser. Entrega, não antes de preferir o inferno a viver, mas entrega e depois percebe o quanto vai ter de enfrentar pra poder ser pra essa pessoa, exatamente aquilo que você quer que sejam pra você.

Por outro lado, mas não tanto por outro lado assim, já que a minha inteira é um emaranhado de coisas que se entrelaçam das formas mais curiosas e até divertidas possível, eu percebo que muitas vezes durante esse ano estive ao ponto de ficar doida de vez. Pensei em diversos momentos que estava decididamente louca de pedras e que nada mais poderia fazer sentido porque, afinal de contas, a minha sanidade havia atingido o limite e eu estava despencando para o lado não-lúcido de uma vez por todas. E então eu levanto a cabeça, paro e penso: hey, eu já nasci doida. Sem noção. Faltando não um, mas uma meia dúzia de parafusos. Não com apenas uma veia a menos, mas sem uma boa parte dos vasos sanguíneos que deveriam levar, através do sangue, um pouco de oxigênio pro meu cérebro e, talvez assim, conferir pra criatura aqui uma pequena dose de normalidade. Mas que nada. Aprendi a conviver com a minha loucura. Aprendi a olhar pro espelho e dizer: Prazer em conhecê-la. É claro, pras pessoas que mantém até mesmo as calcinhas e cuecas em um determinado espaço bem organizadinho do roupeiro, bem como as idéias no lugar, as contas, os amigos, os amores e a família, okay, então isso é um absurdo e, basicamente, pode mandar internar agora mesmo. Tragam uma camisa de força que o negócio é sério.

Aprendi a aceitar a loucura, não como uma forma de perder o juízo e machucar outras pessoas com isso. Apenas percebi que essa vontade, “a pior vontade de viver”, como eu li em um livro muito bem descrito, é secretamente a melhor vontade de viver. Eu tenho sede de conhecer as coisas e as pessoas. Logo eu que já nasci com o semblante marcado pelo tédio, logo eu que só sou purificada com muita adrenalina e, por favor, não pensem que eu sou do tipo que sai por aí bebendo pra ver se esqueço ou dirigindo em altas velocidades, ultrapassando os limites de velocidade do trânsito e colocando outras vidas em perigo. Não. Não se trata de transgredir regras essenciais ao bom funcionamento da sociedade. A propósito, essas normatividades existem porque algumas pessoas simplesmente não sabem como se divertir sem ferir os outros, e eu não estou falando apenas de uma negligência sobre rodas, mas de machucar também sentimentalmente falando. Eu sou do tipo que fica eufórica com uma música. E não tem uma música certa, nem o momento certo, nem o sentimento certo, mas aquela epifania em que tudo dá certo, o tom, a dor, a alegria, a pessoa, o beijo, o abraço, a palavra, a frase, o olhar, ah, o olhar! O caminho por onde passo, um pé à frente do outro, uma idéia surgindo em ligação com um livro que acabei de ler, a concordância tácita e expressa entre o coração e a cabeça que decidiram viver como se fosse a última coisa a ser feita.

Muitos poemas seriam necessários pra explicar aquilo que sinto e bem provavelmente dariam um lindo tom melancólico ao texto todo, mas, sinceramente? Por acaso existe mais verdade e poesia em admitir que cada dia é único? Que cada dia esconde um segredinho extraordinário morrendo de vontade de ser descoberto? Que cada dia traz em si uma utopia doida de vontade de ter esse nome violado pra se tornar uma realidade bem-sucedida? Quer dizer, não se trata de apenas ser uma verdade, mas se trata de ser algo, de existir no plano do concreto, seja esse algo uma coisa totalmente abstrata como um sentimento voraz de ser feliz. Sentimento doido de estar entre pessoas que julgam as pessoas chatas, chegar, virar e falar (antes, limpar a garganta): eu sou chata, e daí? Sou neurótica, maluca, desnecessária, inteligente, eu diria esforçada, porque afinal de contas eu me esforço mesmo em procurar conhecimento, coisas interessantes pra se falar em um diálogo corriqueiro, que pode muito bem deixar de ser corriqueiro pelo simples fato de que não se discute fatos, mas também idéias. Quer dizer, é ótimo discutirmos fatos, mas as idéias instigam bem mais, nos fazem pensar e têm um altíssimo teor de excitação, te corroem de curiosidade e te fazem ir muito mais além, “depois de se pensar que já não se pode mais”, como bem já explicitou o fabuloso Shakespeare. Muito melhor do que discutir, de forma patética e medíocre, pessoas.

A questão é: passei por tanta coisa. E não simplesmente passei. Estive em contato, aprendi, ensinei, vivenciei, e como sempre faço, me admirei com cada momento. Aliás, caso você queira saber, o meu grande combustível é a admiração. Sou movida à comoções. Sinto medo, prazer, alegria, tristeza, tristeza profunda, e alegria eufórica, compaixão, ódio, empatia, enfim, uma infinidade de sentimentos que deixariam qualquer pessoa com alto teor de conformismo maluca, como se eu já não fosse meio insana, claro. “Meio insana” é elegância e modéstia da minha parte, mas como bem se sabe eu sou um poço de condolências. Não conforme o que impõe o conceito padronizado do resto do mundo, mas como eu julgo interessante.
E ainda para o acaso de me permitirem, eu, apesar de ter levado tantos tombos durante esse ano, também tive muitas ascensões. Quer dizer, não há nada de extraordinário em se conseguir um estágio simples e estar indo para o terceiro semestre de um curso quando este tem dez, mas, se eu não achar isso legal, quem vai? Afinal de contas, eu preciso sair de algum ponto. A marcha ainda pode estar lenta, mas logo, logo ela vai aumentar, de forma gradativa, até porque ninguém é doido aqui, né? Também posso afirmar que eu mesma me surpreendi com a minha própria capacidade de reconstrução pessoal neste ano que passou. Toda vez aparecia alguma coisa que eu respirava fundo e pensava “ferrou” (não era bem essa a palavra que eu dizia, mas como ilustração não-mal educada creio que ela tenha sido bem utilizada). Mas não. Nada “ferrou” o suficiente que não possa ter tomado alguma atitude pra melhorar. Só a morte é irreversível e, ao que me consta, estou bem vivinha por aqui ainda. Então sim, seja nas maldições de cada dia, como se eu tivesse saído de sapatos altos inclusive o salto ia quebrar, também houve os grandes momentos, não apenas grandes acontecimentos intelectuais, bem como emocionais. Afinal de contas, a vida é bem mais que ciência e amor. E não é que é mesmo?!

Eu cheguei a tantas conclusões esse ano, mas suponho que uma das mais importantes é: ninguém consegue ser nem que seja um tantinho feliz se não se permitir assim o ser. Ninguém vai conseguir fazer uma pessoa feliz se não ser a si próprio primeiro. Ninguém vai amar ninguém se não amar a si próprio. Barriguinha saliente? Falta de músculos ou tanquinho? Dentinho fora do esquadro, cabelo meio mal-humorado sempre em bad hair day ou pé torto? Que seja, você não é e nunca vai ser aquilo que aparenta e, se quer saber bem a verdade, um bom papo e um conjunto de idéias interessantes transforma qualquer patinho feio no belo cisne, na pessoa fascinante que você vai querer passar cada “maldito” dia da vida ao lado, bem como te transforma na pessoa dos sonhos de alguém. Cheguei à conclusão de que somos todos especiais, inclusive eu, com essa meia dúzia de neurônios meio falhos, idéias capengas, por vezes extravagantes e esses medos bobos, inseguranças de adolescente e reclamações de adulto. Ora, eu sou random, e você? Eu assumo as minhas responsabilidades, procuro gritar quando tenho vontade ou quando é muito necessário, e sou igualmente capaz de não gritar coisíssima nenhuma se é pra preservar coisas maiores e mais importantes do que um surto psicótico meu – por exemplo, as pessoas das quais eu gosto. Eu assumo as conseqüências, confesso que por vezes quis ser uma super-heroína e esquecer que também preciso de, no mínimo, oito horas de sono por noite, bem como me alimentar direito, já que nosso organismo não absorve nutrientes por osmose. Fui fraca, fui forte, chorei, escondi o choro, fiz de conta que não foi comigo, assumi as dores que não deveria e me preocupei à-toa, vivi e morri um pouquinho também, todos os dias. Aprendi a valorar algumas coisas e assumi um desapego por outras, que por lá meus motivos passei a considerá-las obsoletas. Conforme escrevi em um ensaio meu de quando mais nova, “mudar o conservado conservar o mudado”. Não é genial? Bem, eu achei, uma fedelha como eu escrevendo essas coisas que fazem pensar não é lá grande coisa, mas a fedelha sou eu, e desculpe se eu me achar importante, se eu soar arrogante, mas, ah, às favas com modéstia. Querendo ou não, eu me importo com o que está à minha frente, faço questão de não deixar que assumam no meu lugar as minhas competências porque afinal de contas, “dê à Cezar o que é de Cezar”.

Certo. E o que estou querendo dizer com isso mesmo? Ah, não sei muito bem, parece que esse texto meio que tomou os contornos de uma retrospectiva feita por uma garota simples, trancada dentro de um quarto escuro de uma casa de praia, totalmente revestida da pior vontade de viver. Aquela vontade insana de ver tudo o que tiver pra ver, e tomar pra si todas as conseqüências dos próprios atos. Subir na vida? É, quem sabe, quem não quer que atire o primeiro tijolo. Mas não às custas dos outros. Mudar o mundo? Potencialmente, mas, primeiro, arrumar o próprio quarto.

3 comentários:

Nuwanda disse...

Até me deixa confusa; Pessoa normal ou esquizofrenica bipolar, já não se julga mais dentro de um enquadramento bipede, ou boa 'especime' de homo sapiens. Devidamente mulher, naturalmente complicada. Vivida essência Lithium!

Nuwanda disse...

Me lembra uma frase que eu gosto muito, de Maria Callas, a maior interprete da ópera sec.XX

"Se eu morrer antes de você, diga a todos quem eu fui"

sei lá. só me ocorreu

Nuwanda Corrige disse...

Não é vivida, é Vívida..... eu nao pratico muito a arte da acentuaçao...